Por que precisamos falar de saúde mental nas empresas?

Por Júlia Ramalho

O assunto não é de interesse exclusivo dos trabalhadores. Para os empresários é tão ou mais essencial diante da crise de saúde mental no Brasil e no mundo. 

Os empresários serão altamente beneficiados pela entrada em vigor da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), determinada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). A iniciativa é essencial nos tempos de incertezas e mudanças nas relações de trabalho. Os gestores das áreas de pessoas e estratégicas devem considerar que, ao olhar e cuidar da saúde mental nas organizações, as empresas também se tornarão mais produtivas, reduzindo o “presenteísmo”, uma tendência em que o trabalhador está fisicamente presente, mas mentalmente ausente do trabalho”.

Os dados são impactantes. E não há como negar que causam problemas em empresas de todos os tamanhos. Os transtornos de saúde mental são responsáveis por 38% de todas as licenças no INSS, de acordo com dados da pesquisa Panorama da Saúde Mental nas Organizações Brasileiras, realizada em 2023. No cenário de mudanças dos mercados e da sociedade, a expansão de problemas é inevitável. Os afastamentos por saúde mental no Brasil tiveram aumento, entre 2014 e 2024, de 68%, chegando a 472.328 afastamentos em 2024. 

É por conta do tamanho do problema que os ganhos para empresas, além dos trabalhadores, tendem a ser o melhor argumento para justificar a necessidade de falar de saúde mental nos ambientes corporativos. Os benefícios estão vinculados à compreensão de que há, global e nacionalmente, uma tendência de grave crise de saúde mental. Com a previsão de que até 2030 a depressão será a principal doença no mundo, é necessário constatar que o problema tende a crescer continuamente. 

Desafios: o mundo em depressão

Líder do “ranking” de ansiedade e depressão na América Latina, o Brasil registrou, em 2015, aproximadamente 170.830 trabalhadores afastados. O número saltou para 289 mil em 2020, representando um aumento de mais de 50% em cinco anos . Em 2024, os afastamentos ultrapassaram 440 mil, mais que o dobro registrado em 2014. Quase um em cada três brasileiros convivem com crises depressivas — o burnout — no mercado de trabalho. 

Nove em cada dez colaboradores mudariam de emprego em função da saúde mental. O dado demonstra a alta prioridade que os trabalhadores dão ao seu bem-estar mental. Há o reconhecimento de que problemas de saúde mental não afetam apenas a produtividade, mas também podem desencadear comportamentos violentos no ambiente corporativo. 

Agressões no trabalho acontecem com frequência cada vez maior, como resultado da ausência de políticas de monitoramento. Em fevereiro, um funcionário foi flagrado agredindo um colega de trabalho em Balneário Camboriú. O incidente, registrado em vídeo, gerou preocupação e levantou discussões,  entre os demais funcionários, sobre segurança no ambiente profissional.

O estresse extremo, aliado a condições de trabalho precárias e falta de apoio psicológico, contribui para um ambiente laboral insalubre. Um exemplo preocupante é o das forças policiais no Brasil, onde o suicídio se tornou a principal causa de morte não natural entre os agentes, superando óbitos em operações. Entre 2018 e 2023, mais de mil policiais cometeram suicídio, evidenciando a gravidade da crise de saúde mental nesse setor .​

Diante desse cenário, a Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1) oferece um instrumento crucial para o gerenciamento de riscos ocupacionais, incluindo os psicossociais. Atualizada pela Portaria MTE 1.419, a NR-1 estabelece diretrizes para que as empresas identifiquem, avaliem e controlem riscos relacionados à saúde mental no trabalho. 

As organizações têm até 25 de maio deste ano para implementar o Programa de Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO), que abrange desde agentes físicos e químicos até fatores ergonômicos e psicossociais. Essa iniciativa busca prevenir assédios, violências e promover um ambiente laboral mais saudável

Júlia Ramalho é responsável técnica e coordenadora da equipe de psicólogos e parceiros da Estação do Saber – Saúde Mental, Bem-Estar e Desenvolvimento.  Júlia é psicóloga clínica, coach,  mestre em administração e palestrante. 

E você, como está vendo essa mudança de lei?